* Crônica publicada na edição 1160 do Jornal Observador
As
luzes apareceram por volta das 22 horas. Era uma noite nublada e de qualquer
ponto da cidade era possível avistar os dois grandes círculos que,
misteriosamente, faziam traçados aleatórios no céu.
Houve um alvoroço nas ruas. “Que diabo é aquilo?”.
“É o fim do mundo!”. “Oh meu Deus, uma invasão alienígena!”. “Nostradamus
previu isso!”. “É nada: é bíblico. Apocalipse, mas não me lembro o versículo!”.
“Não fale em diabo numa hora dessas, homem!”. “Tende piedade de nós, Senhor!”.
O
padre, um europeu dono de um português lastimável, não hesitou. “Há duas luzes
estranhas sobre nossas cabeças”, anunciou solenemente no alto-falante da Matriz.
Prontamente um grupo de senhoras assustadas se reuniu no templo para rezar o
terço. Agora a população inteira estava na rua observando o fenômeno.
Amedrontadas,
as crianças se agarravam às mães. Os homens se armaram com foices e garruchas. “Estejamos
preparados para o que der e vier”, diziam uns aos outros procurando não
demonstrar o temor que sentiam.
No
boteco, um sujeito trouxe à tona a reportagem televisiva recentemente veiculada
sobre a autópsia de um extraterrestre.
-
É evidente que estão aqui por causa disso. Talvez não tenham gostado da matéria:
revelou a existência deles.
-
Ficou louco, foi? E por acaso eles têm televisão lá? – acudiu o outro.
-
É claro que sim, e com parabólica e tudo. Se eles têm naves espaciais, por que
não teriam uma tecnologia tão obsoleta? Um silêncio momentâneo inundou o
estabelecimento.
A
polícia foi acionada. “Vou consultar o meu superior: nunca vi um caso assim”. A
situação permaneceu inalterada por algumas horas. Vencidas pelo cansaço, pouco
a pouco as pessoas foram se retirando. “Vamos aguardar o amanhecer. Se essas
luzes ainda estiveram aí, a gente vê o que faz”.
Na
madrugada, dois adolescentes caminhavam despreocupadamente pelas ruas já silenciadas.
Chegavam de um baile promovido na cidade vizinha.
-
Já tinha visto um canhão de luz?
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Não, muito menos dois. Que tecnologia, não? Garanto que dava pra ver os círculos
daqui.
-
Será? O bagulho não deve ser tão forte assim.
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