terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Fogo no Céu*


* Crônica publicada na edição 1160 do Jornal Observador

As luzes apareceram por volta das 22 horas. Era uma noite nublada e de qualquer ponto da cidade era possível avistar os dois grandes círculos que, misteriosamente, faziam traçados aleatórios no céu.

   Houve um alvoroço nas ruas. “Que diabo é aquilo?”. “É o fim do mundo!”. “Oh meu Deus, uma invasão alienígena!”. “Nostradamus previu isso!”. “É nada: é bíblico. Apocalipse, mas não me lembro o versículo!”. “Não fale em diabo numa hora dessas, homem!”. “Tende piedade de nós, Senhor!”.

O padre, um europeu dono de um português lastimável, não hesitou. “Há duas luzes estranhas sobre nossas cabeças”, anunciou solenemente no alto-falante da Matriz. Prontamente um grupo de senhoras assustadas se reuniu no templo para rezar o terço. Agora a população inteira estava na rua observando o fenômeno.

Amedrontadas, as crianças se agarravam às mães. Os homens se armaram com foices e garruchas. “Estejamos preparados para o que der e vier”, diziam uns aos outros procurando não demonstrar o temor que sentiam.  

No boteco, um sujeito trouxe à tona a reportagem televisiva recentemente veiculada sobre a autópsia de um extraterrestre.
- É evidente que estão aqui por causa disso. Talvez não tenham gostado da matéria: revelou a existência deles. 
- Ficou louco, foi? E por acaso eles têm televisão lá? – acudiu o outro.
- É claro que sim, e com parabólica e tudo. Se eles têm naves espaciais, por que não teriam uma tecnologia tão obsoleta? Um silêncio momentâneo inundou o estabelecimento.

A polícia foi acionada. “Vou consultar o meu superior: nunca vi um caso assim”. A situação permaneceu inalterada por algumas horas. Vencidas pelo cansaço, pouco a pouco as pessoas foram se retirando. “Vamos aguardar o amanhecer. Se essas luzes ainda estiveram aí, a gente vê o que faz”.

Na madrugada, dois adolescentes caminhavam despreocupadamente pelas ruas já silenciadas. Chegavam de um baile promovido na cidade vizinha.  
- Já tinha visto um canhão de luz?
- Não, muito menos dois. Que tecnologia, não? Garanto que dava pra ver os círculos daqui.
- Será? O bagulho não deve ser tão forte assim. 

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